Baahahal


Baahahal

Baaaaahh
Ah ah ah ah
Há papel para isto tudo?
O aço é duro
O osso é mole
Só sobrou cascalho
O pilim virou pudim
Nem cheta restou
Do restolho ao olho
O cascalho no fogo
E o cão?
ITA Ita ufa UFO

Do Ouro aos Deuses
No episódio do bezerro de ouro, contado no Livro do Êxodo, manifesta-se a tensão entre poder, representação e matéria, e a coexistência de extremos num mesmo objecto: a criação de imagens e a sua destruição, o visível e o invisível, o material e o imaterial, o animado e o inerte. O bezerro é sagrado não porque representa Deus ou porque é feito de ouro, mas porque é uma imagem divina. A imagem é tão poderosa que concorre com Deus como um seu rival. A sua materialidade consegue tornar visível o que supostamente seria invisível, consegue tornar presente a divindade. É esse paradoxo de concreto e abstracto que caracteriza também a arte.

Uma intervenção Pizz Buiniana nesta história só podia provocar a intrusão de uma gargalhada, uma espécie de glitch na palavra Baal, deus dos cananeus representado como um bezerro. Pizz Buin pode cair na tentação idolátrica, mas fá-lo através de um «iconoclash», um lugar ambíguo de destruição/criação: a imagem pode reinventar-se a si mesma e reproduzir-se como imagem tendo por base a destruição da própria imagem.

Em Baahahal, propõe-se a veneração de uma forma que vive do disforme, um totem de corpos irreconhecíveis. O fogo criador gera neste caso um processo de desdiferenciação, uma regressão a um estádio anterior que permite à matéria transformar-se ela mesma numa outra coisa — um processo de devir-outro que está em permanente acontecimento. Aqui, é a própria obra que instaura um espaço de procura de uma imagem em potência. Uma imagem-que-foi transformada agora numa imagem-ainda-a-ser, ou numa «arte ainda por vir» atingida já pela fúria do impacto da sua aparição.

Liz Vahia
A autora não segue o Acordo Ortográfico em vigor.


Pizz Buin é o colectivo artístico de Rosa Baptista, Irene Loureiro, Vanda Madureira e Sara Santos, fundado em 2005 no contexto da escola de Artes Plásticas da ESAD.CR, onde todas se licenciaram.

O seu percurso é marcado pela acção, onde a crítica e o humor são o principal medium para criticar os agentes e as lógicas do sistema artístico: a obra de arte e a sua sacralização, as referências anteriores ao objecto de arte, a situação vernissage, a estrutura expositiva institucional, os intermediários e a condição do artista. Na sua prática, é recorrente a participação de mais artistas, insistindo assim na colaboração entre a comunidade artística.

A sua obra encontra-se representada na coleção de arte da Fundação EDP com CASA, adquirida em 2015 à Colecção de Pedro Cabrita Reis, e na Colecção de Arte Contemporânea do Estado Português com Inferno: apareceu em Rio Tinto, adquirida em 2021. Em 2023 editaram, em parceria com a Stolen Books, o livro de artista Calhamaço com o apoio da DGArtes.


Cascalho, 2023
23 x 19 x 14 cm
Ouro nórdico
Cacau, 2023
24,5 x 12,7 x 12 cm
Ouro nórdico
Duros, 2023
19,5 x 13 x 9 cm
Ouro nórdico