Água
Moirika Reker Gilberto Reis e Pedro Vaz
Moirika Reker Gilberto Reis – ( MRGR) – são uma dupla de artistas que, com Pedro Vaz são autores que tem em comum uma profunda relação ética com a arte. A natureza ocupa em ambos um papel central da sua reflexão.
MRGR são artistas que olham com grande cepticismo para a voragem contemporânea de criação de imagens. O seu trabalho tem vindo a tornar-se progressivamente mais reflexivo e menos prolixo, por considerarem que o artista deverá posicionar-se do lado das ideias mais do que das imagens. Uma nova imagem produzida só será admissível se extremamente necessária. A sua obra tem-se aproximado progressivamente da palavra, que se manifesta através da criação de textos de natureza poética que afirmam um posicionamento ético dos artistas perante o mundo onde habitam. É uma obra que privilegia a subtileza à evidência, a contenção, à expressividade. A sua presença nos circuitos regulares da arte contemporânea tem vindo voluntariamente a reduzir, e coincide apenas com momentos em que os artistas consideram ser relevante a sua presença, fazendo dela um notável exercício de probidade.
A obra que aqui se apresenta é um tríptico constituído por imagens de natureza fotográfica que os artistas designam apenas por superfícies de reflexão. São manipulações ou inscrições de luz sobre uma superfície, mas que na verdade lhes importam apenas como superfícies manipuladas que nos devolvem por reflexo o mundo que lhes está defronte, que será sempre paisagem humanizada uma vez que a obra só se completa com a presença do espectador que a contempla e que pela sua inalienável condição humana, a humaniza. São obras que por essa razão reclamam o estatuto primeiro da arte como processo singular de representação – re-apresentação – do mundo, sendo que está reapresentação será sempre um realinhamento, uma reconstrução que resulta de uma desconstrução.
Pedro Vaz resiste a mostrar-nos a finitude do representado, os contornos que o fixam, que o estabilizam, as fotografias ficam para trás na sucessão do percurso, a queda de água está intencionalmente desfocada e a substância líquida torna-se numa pulsação de luz e cor onde a forma perde a sua espessura.
O paisagismo de Pedro Vaz é também produto de uma contradição como foi o de Constable e de Turner, produtos culturais do capitalismo nascente e da revolução industrial. Vivemos numa época pós-fordista e o nosso quotidiano, o das nossas viagens, das nossas permanências faz-se num território ocupado por “monumentos ao presente não-histórico”: pedreiras transformadas em lagos contaminados, esplendores da industrialização transformados em cemitérios do trabalho morto, ruas inacabadas de bairros desabitados, campos repletos de ruínas; tudo parece convencernos que já não existe um palmo de terra onde o mundo natural não seja apenas um baldio à espera de ser construído. Contudo a posição de Pedro Vaz é antitética em relação a este monopólio e aparente fatalismo de readymades sociais e tecnocráticos e contraria em absoluto o nihilismo económico que nos configura como “robot-produtores consumidores”. É este o enfoque ideológico das obras que aqui nos presentifica.
Para a caracterização do trabalho de Pedro Vaz utilizámos fragmentos do texto de Pedro Pousada sobre a exposição Stimmung de Pedro Vaz.
Carlos Antunes e Pedro Pousada